Sou Tássio Ferreira, Multiartista da Cena, Taata dya Nkisi responsável pelo Terreiro Unzó ia Kisimbi ria Maza Nzambi (Simões Filho-Ba), Professor Adjunto da Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB), Centro de Formação em Artes e Comunicação, Doutor em Artes Cênicas. Estar na UFSB é a possibilidade de exercitar a docência com a plenitude e integralização de meu ser, isto porque aqui minha vida espiralada, trançada com minha ancestralidade Congo-Angola, com minhas experiências e atravessamentos de Candomblé, potencializam minhas pesquisas acadêmicas, estratégias docentes e práticas artísticas. Neste espaço acadêmico senti o acolhimento de ’mutuê’ (cabeça), me dando sentido e acreditando em uma formação em Artes para além dos centros – inclusive o meu de partida – e o protagonismo no exercício de experimentar em profundidade uma formação negroindígena.

A luta antirracista é a base desta existência afrografada pelo meu caminho nas águas de Kisimbi, oportunizando compreender a vida pelo abebé (espelho sagrado) que minha mãe carrega. O espelho é símbolo de suas águas e potencialidades. Enquanto houver possibilidade de se espelhar em nossas próprias águas, se enxergar, se vê por uma outra ótica, há certeza de um bom caminho. Apesar do exercício diário desta filosofia de língua kikoongo, ainda há muito o que fazer no combate diário às diferenças, às hierarquias, às autarquias ou mesmo ao falseamento de alguma democracia neste país.

Desde o processo de reestruturação, ressalta-se alguma balbúrdia vestida de horizontalidade, na qual os seus pares nadam em águas turvas, e logo se cansam, porque não chegam a lugar algum; a chegada já havia sido pensada e não comunicada.

O destaque da UFSB se dá por várias perspectivas, no ímpeto de ser radicalmente genuína, sobretudo por uma estrutura que privilegia as cotas raciais e as regulamentadas. Porém, para esta universidade que já se organiza neste sentido, é preciso avançar para pensar em novas políticas (ou mesmo as já em curso em outras instituições) que garantam a formação de estudantes cotistas, em especial. a) É preciso alargar as bolsas de auxílio e flexibilizar os editais – de exigência e formato que não contemplam a realidade de uma maioria – excluindo àquelas que não possuem o mínimo para suas necessidades. b) Sem mencionar a falta de apoio profícuo à extensão universitária e o impulsionamento para que esta se estabeleça sem o peso de quem carrega uma lata d’água por demais pesada, equilibrando-se no chão quente. Quem são as/es/os extensionistas/es da UFSB? c) Os Mestres e Mestras dos saberes tradicionais não ocupam cadeiras docentes, e os docentes não-mestres que desejam viabilizar estes lugares, enfrentam uma burocracia tonteante e desarticulada com os próprios comandos internos. d) Não há um projeto administrativo que contemple as diferenças raciais condizente com a imagem pública e o compromisso social desta instituição, já publicizado em sua carta de fundação. Mais do que nunca precisamos de políticas pluriepistêmicas e interculturais, com estratégias negrorreferenciadas articuladas com os saberes dos povos originários, para que alcancemos aquele lugar prometido a estas terras e territórios sul baianos. A UFSB é para quê? Quem? Àquelas e aqueles membros internos à panela onde a comida que alimenta todes é preparada, não pode opinar sobre o tempero utilizado, e sobre os efeitos dos ingredientes aqui depositados. Quem vai comer?

Eu apoio a chapa 02, na esperança de que a nossa panela prepare alimentos para a maioria de nós, sanando, assim, a Nzala (fome) daquelas que esperam a ngudia kasambuka (comida sagrada) pactuada com a Terra e do Território do Sul da Bahia.